segunda-feira, 23 de março de 2009

Cuba: Mulher e cinema hoje.


Se a educação dos homens é a forma
futura dos povos, a educação da mulher garante
e anuncia os homens que dela poder o surgir.

José Martí.



É com muito orgulho que a Diretoria de Culturas/DICULT –PROEX-UFU- apresenta a II Mostra de Cinema Cubano: A mulher na filmografia da Revolução. Duas s o as grandes satisfações, a primeira seria dedicar este acontecimento cultural mulher brasileira, cubana e universal, neste mês de março que é dedicado a ela. Porque, como escreveu o poeta José Martí "toda a pátria está na mulher: se ela falha morremos: se ela é leal, somos a essência".
A segunda satisfação é a oportunidade de continuar um projeto artístico de qualidade, para o desfrute da comunidade universitária e não-universitária, e que, já na sua terceira versão, - prevista para outubro deste ano - se abrirá ao cinema ibero-americano.


O primeiro filme desta mostra será a película A idade da peseta (2006)1 do diretor Pável Giroud (1976). Tanto ele como os também muito jovens Arturo Infante (roteirista) e Luis Najmías (fotógrafo), são formados na Escola Internacional de Cinema de São Antônio dos Banhos da Havana. 2 Ou seja, o filme é um produto da vanguarda criativa da Ilha, na atualidade. Na película faze-se uma excelente reconstrução da Havana de 1950, embora seja um filme feito com poucos recursos, no entanto, como bem apontou o diretor Pável Giroud, discípulo do mestre Wong Kar Wai, que uma boa angulação, para situar no tempo e no espaço os personagens já é suficiente. A obra está precedida de uma pesquisa de estilos, modas e costumes da época. Por isso, A Idade da Peseta é um filme onde tudo se revela em uma perspectiva minimalista, acudindo a pequenos detalhes e evitando os erros de ambientação. Nesse contexto, transcorre a cândida evocação do universo afetivo de um menino (Iván Carreira) ao entrar na adolescência. Nos principais papéis, sobressai como protagonista a atriz espanhola Mercedes Sampietro (Violeta); e o também espanhol José Angel Egido e as cubanas Susana Tejera (Alicia) e a modelo Carla Paneca (Nuria). O filme permite uma exploração do universo feminino e da burguesia decadente do período pré-revolucionário, e todo isso com o apelo a uma deliciosa visualidade.


Na seqüência, apresentamos o filme Lucía (1968) do diretor cubano Humberto Solás (1941-2008), uma das figuras emblemáticas da filmografia do Terceiro Mundo e um dos fundadores do Cinema Novo Latino-americano.3 Lucía é uma obra mestra do cinema cubano, tinida até hoje como a consagração definitiva de um cineasta e de uma filmografia nacional. A obra está composta por três contos. Em cada um deles a protagonista leva o nome de Lucía, ou seja, uma representação da mulher cubana em três tempos. A três Lucías encadeiam a épica pessoal com o fluir da epopéia nacional emancipadora, libertação que convoca a mulher como ente participativo e definitório. Este filme é a primeira mirada do cinema cubano ao devir histórico, visto como caixa de ressonância para o íntimo, sim que a descrição da alma feminina obstaculize a visão das raças e povos acrisolados na nação cubana. A crítica tem reconhecido neste filme o extremo cuidado formal e de representação, sob a inspiração de Serguei Eisenstein, Luchino Visconti, Orson Welles, Glauber Rocha e os grandes neo-realistas, assim como seu gosto pela recreação enfática e melodramática dos signos culturais do passado, onde é notória a espessura filosófica, artística e histórica. Humberto Solás é considerado um cultivador da sedução através do virtuosismo estilístico.


De Pastor Vega (1940-2005), outra das figuras principais do audiovisual latino-americano - e que se considerou a se mesmo como um neo-realista tardio (já n o existe nenhum deles vivo)-, se inclui nesta exibição Retrato de Teresa (1979) e As profecias de Amanda (1999). As duas obras est o interpretadas por Daisy Granados, sua esposa e atriz fetiche, uma das figuras maiores do cinema da Ilha.4 Retrato de Teresa (1979), cujo roteiro escreveu junto ao escritor Ambrosio Fornet, é um autentico exemplo da sétima arte compromissada com seu tempo e revelador da problemática universal da mulher. É particularmente interessante a conjuntura histórica em que se faz Retrato de Teresa, pois quatro anos antes, em 1975, aprovou-se em Cuba o Código de Família, Lei que estipula as responsabilidades domésticas compartidas entre os membros da família, enquanto o discurso oficial falava que dentro da Revolução estava tendo lugar outra revolução entre as mulheres. O filme é contestatório e mostra que vinte anos após da Revolução a mulher continuava sendo objeto da cultura falocêntrica, o que abriu uma polêmica que deve ser revisitada em nossos dias. Num momento climático, o personagem revoltado fala ao marido: "me encerraste no fog o, na merda, estas quatro paredes, não te lavo mais a roupa, porque não sou tua escrava". Persistindo também nos direitos da mulher, vinte anos após, Pastor Vega filma As Profecias de Amanda, um caso verídico de uma vidente cubana, a qual também reclama seus direitos a ser quem ela é, com toda sua humanidade, beleza e contradições.


A Bela do Alhambra (1989) Pr mio Goya 1990 e indicação ao Oscar em 1991, como melhor película estrangeira - é outro dos filmes interessantes incluídos nesta exposição. Seu diretor, Enrique Pineda Barnés (1933), é considerado como um realizador mítico tanto em Cuba como no mundo. 5 Estima-se também um precursor da videoarte. A película é um musical esplendido que desvela duas obsess es do autor: a problemática da mulher artista e sua paix o pelo teatro. O roteiro é uma adaptação do romance Canção de Rachel do poeta e narrador Miguel Barnet, onde se conta a história de uma vedete do teatro vernáculo cubano, e também a história do Alhambra -teatro havanero só para homens na década de 1920-, no qual, tais vedetes, faziam as delícias para os homens. É excepcional no filme a descrição da vida da Havana entre 1920 e 1935, com as festas da aristocracia, os grandes negócios e a corrupção da época; além da música com o melhor do som musical cubano aliado a uma cenografia de luxo. A problemática da mulher artista e sua luta por ser ela mesma é o grande desafio que enfrenta a protagonista.


Encerrando o evento, apresentamos Mesmo longe (2003) de Juan Carlos Tabío, considerado o diretor cubano mais popular na Europa nos últimos anos. Para a realizaç o do projeto Tabío se apoiou em dois experientes colaboradores de seu também muito sucedido Lista de espera (2000). Eles são Arturo Arango, no roteiro, e Hans Burmann, na fotografia. A crítica tem reconhecido coerência do roteiro e a precisão e profissionalidade da fotografia. Além disso, o filme conta com um reparto de primeiro nível, integrado por Susana Pérez, Mirta Ibarra, Bárbaro Marin, Mijail Mulkay, Asenneth Rodríguez, Laura Ramos, Natacha Díaz e o espanhol Antonio Valero, o que resultava necessário para um afinado trabalho de direç o dos atores, num contexto que usa a música como inter-texto paródico das três histórias que se contam. O diretor adverte que Mesmo longe não é uma película de contos separados um após de outro. Todo nela se entrelaça e vincula em uma soa linha, em uma unidade que não se rompe nem pelo estilo de atuação nem pela fotografia. O fio condutor entre as histórias é uma das claves não reveladas para não afetar o interesse com que o público pode assistir ao filme. Apela ao conceito mesmo de paródia que se fixa na inteligência do expectador, fazendo evidente o jogo com o melodrama, além do gênero mesmo. As histórias desenvolvem conflitos que afetam hoje a mulher cubana e universal: a emigração, a extorsão, o abuso, a realização profissional, a conduta ética num mundo cada vez mais perverso.


Desejamos a todos os espectadores em geral, e as mulheres em particular, o maior desfrute e cultivo da inteligência através das obras fílmicas que exibimos. Sabemos que ainda estamos longe de merecer as mulheres que nos acompanham no dia-a-dia e que muito fazem elas para recompensar o respeito que lhes temos.


A Diretoria de Culturas da PROEX-UFU agradece profundamente a todos os apoiadores: (mencionar a todos os apoiadores: Diretoria de Comunicação, imprensa, etc.), assim como equipe de realização e professores palestrantes.


Orlando F. Aquino & Irley Machado.Fevereiro, 2009.

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